Passeando pelos campos de Morpheus.
Acordo e ela está no meu quarto, fazendo acrobacias resultado de treinos e treinos e treinos e treinos, se jogando com pulos loucos na parede e quase quebrando meu velho som e meus vinís e eu vendo aquela porra toda sem saber o que estava acontecendo e noto a tatuagem nas costas dela que parece incompleta, um desenho e uma frase com o começo faltando, como se esperasse por algo pra escrever aquela primeira palavra. Sei que está escrito em português, mas não consigo entender e ela continua lá, pulando e caindo no chão em tentativas de fazer sei lá o quê e saio dali, deixando que ela se divirta com o outro expectador que não faço idéia de quem seja, mas sei que havia outra pessoa lá, sim, tenho certeza, sempre há outra pessoa no lance quando se trata dela.
Não lembro de descer escadas ou sair de casa, mas no momento seguinte estou em uma espécie de festa na PI com garotas que gostaria de conhecer melhor e está legal e percebo que tenho que ir pro trabalho e isso me enche de insatisfação - mais um problema que tenho que tolerar - e estou no caminho dessa merda, na verdade estou dentro no elevador, as portas fechando e do lado de fora um cara que nunca vi antes olha pra mim e me reconhece com um sorriso malicioso, exibindo aqueles dentes e olhos negros - todo negro, profundos e brilhantes - com uma expressão de satisfação de quem achou o que procurava por puro acaso e lembro dele, sim, lembro daquela figura sinistra e tenho a certeza que ele me perseguia em outros sonhos e ele caminha em direçãoao elevador e as portas fecham. Acordo com um espécie de mal estar, mas com um tremendo alívio de quem escapou fedendo.
...
E de novo estou aqui, em pé, esperando o tempo passar pra voltar pra casa e penso, fazer o quê? mafusar? bem, acho que deveria dar um tempo já que o catarro ta virando companheiro constante e é foda ter que puxar aquilo lá do meio peito de tempos e tempos e me esgueirar até o fim do balcão e dar a velha cuspida no lixeiro do canto enquanto esses hóspedes hipócritas - sempre pedem pra retirar os registros de consumo de bebida alcóolica da nota fiscal - me esperam e tenho que fazer uma cara de quem está super feliz e pronto pra agradar nesse emprego estressante mas que até que libera uma grana boa aqui e acolá pra garantir as cervejinhas no Manel e que me ajudam a manter minha sanidade mental. E agora o fim do expediente se aproxima e penso mesmo no que fazer na minha folga de amanhã e esperar cada dia passar, afinal está tudo nos trilhos dos meus planos e tudo que preciso é paciência.